TRAVESSIA
Mithra se foi. Deixou o céu cortado por nuvens de sangue
refletidas nas águas tranquilas de Yemanjá. O corpo desta permanece quente,
mantendo em suas entranhas o calor do toque do amado, que passara o dia a
iluminar com maestria suas profundezas. O Vento e a Lua friamente a consolam:
"ele voltará amanhã", repetem ao ver a maré tomando as encostas com
as águas salobras dos olhos da deusa. Só de imaginar que uma tempestade pode
impedir o encontro no dia seguinte, já se torna agitada. Ondas passam a bater
fortemente nas pedras, inocentes nadadores em busca de seus amores lutam incompreensivelmente
contra a súbita correnteza. "É outono, amanhã pode chover", lamenta.
Diante da possibilidade de não mais tê-lo, as águas se revoltam até cansar. Até
maré morta.
Nenhum comentário:
Postar um comentário